Regionalismos
e expressões típicas
Lendas
Provérbios
Quadras sobre
Brunhoso

Tradições
da Páscoa
Tradições de
Natal
Alheiras
Casamentos do
Caneiro
A cultura do
linho
Tudo leva a crer
ter sido o porco uma das primeiras espécies a ser domesticada.
A criação de porcos terá sido prática corrente na China, entre
4000-5000
a.C., mas desde muito cedo dela encontramos vestígios por toda a
Ásia, Europa e África.

Do ramo dos animais
vertebrados, da espécie dos mamíferos, da ordem dos
ungulados e
da subordem dos paradigitados, do grupo dos paquidermes,
da família dos suídeos e do
género sus, o porco pode também ser classificado segundo três
tipos principais de raças (o asiático, o céltico e o ibérico). Das
principais raças suínas da actualidade
salientam-se, das inglesas, a do Yorkshire ou Large White, a do
Berkshire, a do Essex ou Sussex e a do Gloucestershire; das
francesas, a Céltica, a Limosina e a De Bayeux. Em Portugal, avultam
as raças Alentejana e a Bízara.
O porco foi, desde
sempre, um dos animais domésticos cuja criação e consumo maior
relevo possuiu e possui em Portugal.

Alguns ditos populares:
- "Das carnes, o carneiro, das aves, a perdiz e sobretudo a
codorniz, mas se o porco voara não havia carne que lhe chegara";
- "Quem tem porcos tem chouriços e presuntos";
- "Rico como um porco";
- "Queres conhecer o teu corpo? abre ou desmancha o teu porco";
- "Homem e porco só dão lucro depois de mortos";
- "Lavar o focinho a porcos, as orelhas a burros, pregar a padres e
converter
judeus, é tempo perdido";
- "Leitão de mês, cabrito de três, mulher de dezoito, homem de vinte
e três",...), |
A
Matança do Porco

Foi numa manhã fria de Dezembro que assisti à tradicional matança do
porco na casa da minha avó Maria em Brunhoso.
Muito cedo chegou o meu
tio Carlos e a minha tia Ana que iriam ajudar nas tarefas, que pelo que me
disseram, seriam muitas. Chegou também o sr. Francisco com uma enorme
faca debaixo do braço. Tinha fama de matar os porcos rapidamente e era
ele que matava quase todos os porcos da aldeia. Por fim chegaram o tio
Chico e dois vizinhos.
Entraram e comeram figos, pão e azeitonas que acompanharam com um
copo de aguardente para se aquecerem um pouco (como se não bastasse a
enorme fogueira de lenha de carrasco que a minha avó já tinha acendido).
Depois saíram, foram buscar o porco à loje e encaminharam-no para a
porta da curralada onde já estava um agrade e alguns feixes de palha.
Nesse momento, chegou a minha mãe com uma bacia com um pouco de pão e
vinagre espalhados no fundo. Explicaram-me que o tacho serviria para
aparar o sangue e o pão e o vinagre para impedirem que o sangue tralhasse (coagulasse).
Agarraram o porco e colocaram-no sobre o agrade. O senhor Francisco
pôs em prática toda a sua habilidade e, de uma vez só, espetou a sua
enorme faca no pescoço do porco provocando uma diminuição na força
com que o infeliz se debatia e um grande arrepio em mim. A
minha mãe aparava o sangue na bacia dando-lhe volta com um ritmo
compassado à medida que ia acrescentando alguma água.
Quando o porco parou de se debater, pegaram fogo à
palha de centeio. Com calma, foram chamuscando o pelo do porco e
depois a sua pele, esfregando-a com sabão e com cortiça e raspando-a
com facas. Aqueceram as unhas e arrancaram-nas. Depois de bem
lavado, viraram-no de barriga para cima e começaram a abri-lo.
A minha tia Ana chegou para levar as asinhas do coração
("senão o fumeiro voava"), as pontas das costelas, o fígado e
barbada que iria estufar.
Depois de retiradas as tripas a minha mãe tirou-lhes alguma
gordura, enquanto estavam quentes, que seriam fervidas numa panela
(rojões).
Os homens penduraram o porco usando uma estaca com uma
gancha, que fizeram passar pelo cu do porco e se prendia no queixo
do mesmo. A estaca foi encostada a uma esquina, ficando o porco ao
alto uma vez que não havia uma trave para o pendurar. Depois
entravaram e comeram o estufado de carne e o sangue cozido (cortado
em cubos com alho, azeite, vinagre e pimento doce), enquanto se
preparava o almoço.
O almoço consistiu num
prato de arroz de couve branca, acompanhado com salpicão do ano
anterior feito com a tripa do cu e ovo cortados às rodelas, ambos
colocados por cima do arroz. Sopas feitas com pão migado e
amolecidas com o caldo dos potes de ferro que fervem na lareira.
Regadas com azeite a ferver que fazia um som característico ao cair
sobre o pão já húmido (sopas do chize), com sangue cozido esfarelado
por cima.
Depois do almoço a minha mãe e a minha tia foram lavar as tripas para o ribeiro na Veiga.
Utilizavam uma verga de olmo para virar a tripa (pau de virar
tripas) permitindo a lavagem do interior. A água estava muito fria e
o cheiro também não era nada agradável.
Aproveitei o tempo e perguntei-lhes quais seriam as fases
seguintes na conservação da carne do porco. As alheiras só se faziam
depois de desmanchar (desfazer) o porco (normalmente no dia
seguinte). Também eram separadas as carnes (para salpicões, bochas,
linguiças e bulhos). A maior parte da carne seria
conservada em maceiras com sal.
Perguntei também qual seria o processo para fazer os
salpicões que eu tanto gostava de comer na casa da minha avó.
Primeiro preparava-se um alguidar
com suça (água, sal, alho, louro, casca de laranja, um copo de vinho (ou
mais)). As carnes ficavam na suça um dia ou dois. No acto de encher
as tripas juntava-se algum pimento às carnes.
Cheguei à conclusão de que o dia da matança do porco era um
dia cheio de trabalho, mas também um dia cheio de alegria e alguma
festa. Percebi que todas as fases se desenvolviam com calma como
num ritual. Percebi também que o porco, nas diferentes formas em que
é conservado, ocupa um lugar muito importante na alimentação ao
longo de todo o ano.
Xo_oX
Curiosidades da Matança do Porco
- As mulheres e as crianças não
deviam assistir à matança. As expressões de "coitadinho"
influenciavam o matador. Também se pensava que o porco "encolhia o
sangue".
- As mulheres com a menstruação não mexiam na carne, apenas podiam
ajudar a fazer o almoço.
- No dia da matança eram distribuídos pelas casas dos vizinhos
pratos com algumas variedades de carnes para que todos provassem da
matança.
- Os pés e as orelhas eram comidos no Carnaval (com arroz de espigos
de couve).
- Com a gordura (unto) que envolve os intestino, depois de
pisada com um maço de madeira juntando sal e colorau, fazia-se uma
bola que envolta por uma membrana retirada da mesma gordura, servia
para barrar o pão (quando ainda não havia manteiga). |